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Roberto Acioli de Oliveira

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29 de mar. de 2008

Rostos: Fisiognomonia (II)

Aristóteles


“Acima   de   tudo
é   melhor   basear   seus
argumentos a partir de asserções
sobre espécie  e  não sobre gêneros,
posto  que  a  espécie  mais  de  perto
se  assemelhe  ao  indivíduo,  e  é  com
indivíduos   que  a  fisiognomonia  está
preocupada; porque em fisiognomonia
tentamos   inferir  a  partir  de  sinais
corporais  o  caráter  deste ou desta
pessoa particular, e não o caráter
de  toda  a  raça  humana"

Fisiognomonia
Aristóteles



O Rosto e o Corpo

A problemática metodológica básica na fisiognomonia está exposta: a relação entre o particular e o geral. A forma de um animal estará articulada sempre a certo caráter mental, o corpo e a alma sempre estão juntos se são do mesmo tipo. Isto explica porque certos corpos possuem um caráter específico e não outro qualquer. Assim, caráter e corpo afetam-se reciprocamente. Se tudo isto for possível, então a fisiognomonia é praticável (1). Aristóteles mostra os três métodos até então utilizados.


























1) Os gêneros animais são utilizados nas inferências. Assim, quando um homem lembrar o corpo de um gênero, sua alma será idêntica a esse corpo. Alguém que se assemelha a um cavalo, terá o caráter de um cavalo;


2) Utilizam o mesmo método, apenas excluem os animais. Assim, distinguem várias raças, e o caráter de um indivíduo a partir daí;


3) Partindo das expressões faciais características, observam-se as condições mentais que as acompanham: raiva, medo, excitação erótica, etc.


Segundo Aristóteles, este terceiro método pode ser considerado falho, já que alguém pode ser visto expressando uma emoção que não lhe é peculiar, apenas episódica. Ele chega a concluir que isso reduz drasticamente o número de inferências que se pode tirar a partir da expressão facial. Argumenta que não se pode inferir nada a partir de sinais comuns.

Buscar aquelas características que são peculiares àquele gênero animal também é infrutífero. Se pudéssemos captá-las, ao contrário não conseguiríamos captar características mentais peculiares aos diferentes tipos de animais. Cada animal pode ter características que também são encontráveis em outros animais – a coragem do leão é perfeitamente encontrável em outros animais.

É uma afecção mental em comum que devemos procurar. Tratar-se-ia de procurar em que animais ela se repete. Esse animal deve ser numeroso e não possuir nenhuma outra afecção mental em comum, exceto aquela estudada. Aristóteles se pergunta então quanto às qualidades mentais que vão e voltam - que não são permanentes. Não terão muito valor, já que não serão constantes. Sem falar nas afecções da alma que não produzem marcas visíveis no corpo (2).


Aristóteles reconhece a capacidade das expressões faciais comunicarem disposições internas, mas considera fonte de imprecisão nos fixar apenas no rosto. Deveríamos atentar para um conjunto de elementos: expressão facial, movimentos do corpo, gestos.

Sugere um método para a fisiognomonia que não havia sido tentado. Quanto aos animais, devemos nos referir à espécie e não a gêneros inteiros, assim como devemos nos referir aos sinais corporais e caráter desta ou daquela pessoa em particular e não ao caráter de toda a raça humana (3).


Vemos aqui uma tentativa de Aristóteles para dar conta do devir no mundo da experiência sensível. Ele busca uma Verdade, mas admite que ela se expressa de diferentes formas. Na verdade, este é o sentido de sua crítica a seu mestre, Platão.

O elemento importante a se reter do ponto de vista aristotélico é que corpo e alma se afetam mutuamente, a alteração de um leva a alteração do outro. Assim, quando nossa alma está com raiva, o corpo exibe os traços correspondentes. Da mesma forma, quando o corpo humano perde um braço, modificações da alma devem ser previstas. Em sua opinião, é esta crença que explica que os médicos em parte receitem purgantes e dietas para o tratamento de uma alma que sofre de problemas emocionais. De fato, Aristóteles insistia que deveríamos aplicar sempre o método dedutivo. Assim, mesmo sem conhecer seu futuro ofício, poderíamos inferir certas hipóteses baseando-nos no conjunto de seus traços (4).

Bichos Masculinos e Femininos

Aristóteles considerou necessário dividir o reino animal entre machos e fêmeas. O leão (à direita) exibiria o tipo macho em sua forma ideal...

“Boca bem proporcionada: seu rosto é quadrado e não muito ossudo, a mandíbula superior encaixa na inferior e não se projeta para frente: seu nariz pode-se considerar grosso: seus olhos brilhantes são fundos, nem totalmente redondos nem inadequadamente muito esticados, e de tamanho moderado: sua sobrancelha é do tamanho certo, sua testa quadrada e levemente côncava no centro, e sobre sua parte inferior em direção às sobrancelhas e nariz, há uma espécie de nuvem, e do topo da testa até o nariz desce um sulco de cabelos se inclinando para fora: sua cabeça é de tamanho moderado: seu pescoço de tamanho adequado e largo em proporção com uma juba castanho-amarelada sobre ele, que não é nem dura e eriçada e nem muito encrespada. Quase nas clavículas ele é flexível e não muito firmemente articulado: seus ombros são robustos, o peito é poderoso, seu tronco extenso, complementado pelos flancos e dorso: não há carne supérflua em seu lombo ou coxas: suas pernas são poderosas e musculosas, seu andar vigoroso, sua constituição bem articulada e vigorosa, nem muito rijo nem muito mole: ele se move vagarosamente a passos largos, ondulando seus ombros enquanto vai. Tal é sua aparência corporal e em sua alma ele é generoso e liberal, orgulhoso e ambicioso, ainda assim gentil e justo e terno com seus companheiros.


O leopardo (à direita), por outro lado, de todos os animais considerados bravos, aproxima-se mais do tipo feminino, salvo em suas pernas, que usa para executar toda proeza de força. Seu rosto é pequeno, sua boca grande, seus olhos pequenos e brancos, colocados num buraco, mas planos em si mesmos: sua testa é muito longa e tende a ser curva mais do que reta perto dos ouvidos: seu pescoço muito longo e fino: seu peito estreito e seu dorso longo: lombos e coxas gordos: flancos e abdômen retos: sua cor malhada: e seu corpo todo mal articulado e mal proporcionado. Tal é o aspecto corporal, e na alma é medíocre e ladrão, em uma palavra, uma fera de pouca astúcia”.(5)

Nota-se, é claro, a pouca objetividade das conclusões misturadas com a altamente objetiva e clara descrição anatômica.

Nos termos do próprio Aristóteles, não seria aconselhável utilizar leões e leopardos para falar de tigres. Vimos que o estagirita prefere trabalhar com indivíduos e não com gêneros.

Desta forma, se os leopardos podem variar entre si, os tigres então poderiam ser completamente diferentes deles, pouco importando que ambos sejam felinos.

Um Rosto Sozinho Não Significa Nada?

Segundo Aristóteles, os elementos do rosto (olhos, testa, nariz, lábios, cabeça, e o próprio rosto) são apenas mais um dos elementos a serem considerados quando se deseja chegar a uma dedução lógica sobre o caráter de alguém. Vejamos uma descrição do significado que Aristóteles dá a suas partes:

Um nariz grosso significa preguiça, como gado. Entretanto, se o nariz é grosso desde a ponta, marca uma idiotia, como nos porcos. Caso a ponta seja fina, trata-se de alguém irascível, como um cão. Um nariz redondo e de ponta grossa indica o orgulho dos leões. Homens com narizes finos na ponta têm as características dos pássaros. Narizes virados para a direita indicam impudência, como um corvo. O nariz aquilino denota uma alma orgulhosa, como na águia. Lascívia pode ser encontrada em duas formas. Arrebitado, como no cervo e curvo e para cima como nos galos. Narinas abertas são a marca de temperamento violento (7).


Um rosto gordo indica preguiça, como no gado. Quando esquálido, significa assiduidade. Ossudo, covardia, como nos asnos e veados. Um rosto pequeno é sinônimo de alma pequena, como no gato e no macaco. Rosto grande, letargia na certa, como em asnos e gado. Aristóteles conclui que o rosto não deveria ser nem muito grande nem muito pequeno, o tamanho intermediário seria melhor. “Um rosto medíocre significa um espírito intolerante” (8). Olhos pequenos, alma pequena, como nos macacos. Olhos grandes, letargia, como no gado. Num homem saudável, os olhos não serão nem pequenos e nem grandes. Olhos fundos, a vilania do macaco. Olhos pronunciados, a imbecilidade do asno. Portanto, também para os olhos vale a regra do meio termo, nem fundos nem pronunciados (9).


Uma testa pequena, a estupidez do porco. Uma testa grande, a letargia do gado. Uma testa redonda, a idiotia do asno. Uma testa longa e reta, a rapidez dos sentidos, como no cão (10). Cabeça grande, rapidez, cabeça pequena, idiotia – cão e asno, respectivamente. Orelhas pequenas, a disposição dos macacos, orelhas grandes, a disposição dos asnos.




Leia também:

Rostos: Fisiognomonia (I), (III)

Notas:

1. ARISTÓTELES. Physiognomonics. Traduction Loveday and E. S. Forster IN BARNES, Jonathan (editor). The complete works of Aristotle. USA: Princeton University Press Books, 1985, Vol. 1. P. 1240 (1, 807b, 25-30).
2. Idem, p.1238 (1, 805b, 10 à 806a, 5).
3. Ibidem, p.1240 (2, 807a, 30).
4. Ibidem, p.1243 (4, 809a, 20).
5. Ibidem, p.1244 (5, 809b, 15-35 e 810a, 5).
6. Ibidem, p. 1246 (6, 811a, 20-25).
7. Ibidem, (6, 811a, 30-35).
8. Ibidem, (6, 811b, 10).
9. Ibidem, p. 1247 (6, 811b, 20-25).
10. Ibidem, (6, 811b, 30-35). 


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