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Roberto Acioli de Oliveira

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29 de nov. de 2012

Nova Objetividade e Nazismo



 
Antes do 
final da guerra
essa  forma de arte
 havia sumido de cena, 
retornando apenas
a   partir   dos
anos 60 (1)




Flertando com o Inimigo

A vida piorou bastante para os artistas alemães entre 1930 e 1933. Apesar da grande crise econômica que se seguiu à derrota na Primeira Guerra Mundial, entre 1919 e 1923 ainda se conseguia fazer o mercado de arte funcionar. O clima político também se deteriorou, o que gerou as condições que faltavam para permitir a subida ao poder do Nacional Socialismo de Adolf Hitler, em 1933. Neste mesmo ano a Sociedade Kestner da cidade de Hanover, conhecida por sua dedicação à arte de vanguarda, organizou uma exposição curiosamente intitulada Novo Romantismo Alemão. Desde 1929, associações de arte e museus do interior do país já vinham realizando tais eventos de tendência conservadora. Artistas como Alexander Kanoldt, Georg Schrimpf e Franz Radziwill, originários do movimento artístico conhecido como Nova Objetividade (Neue Sachlichkeit) tiveram obras suas expostas no evento Kestner. O catálogo da exposição enfatizava a relação que o trabalho destes três artistas tinham em comum com o de Caspar David Friedrich (1774-1840) e Philipp Otto Runge (1777-1818), figuras de proa do Romantismo alemão que os nazistas tanto enalteciam. Apesar desse tipo de conexão, Sergiusz Michalski não acredita que se possa afirmar que a então declinante Nova Objetividade indiretamente esteve entre os precursores do estilo da arte fascista que começava a se esboçar. (2). (imagem acima, A Família do Fazendeiro Kalemberg, Adolf Wissel, 1939; abaixo, Triunfo da Morte, Felix Nussbaum, 1944)



“Em dívida
com a tradição,
tanto       quanto
com  a vanguarda, a
Nova    Objetividade
pretendia  chegar  à 
posição de um estilo
de   arte    realista
da    época   em
que existiu” (3)



Para os teóricos de arte do nazismo, a Nova Objetividade não passava de um movimento de segunda categoria no universo da arte durante a República de Weimar (1919-1933), o qual era odiado pelos hitleristas. De qualquer forma, a partir de 1933, muitos artistas ligados à Nova Objetividade perderão seus empregos nas escolas de arte alemãs. Alguns da geração mais nova, como Albert Heinrich, Georg Siebert, Werner Peiner e Bernhard Dörries, fizeram carreira durante o regime nazista, embora os artistas nazistas mais radicais os identificassem em função de certa timidez e embaraço. Enquanto isso, Kanoldt e Radziwill, que Michalski caracteriza como membros idealistas do partido nazista, serão indicados para novos postos de ensino – Radziwill, focado no realismo mágico, chegou a participar do pavilhão alemão na Bienal de Veneza em 1934 (4). Por ironia do destino o pacifista Schrimpf se torna um protegido do nazista Rudolf Hess. Embora Michalski admita que Kanoldt e Franz Lenk tenham procurado resistir à pressão e até ajudaram colegas perseguidos (Lenk incluiu quadros de Otto Dix numa de suas exposições), seus contemporâneos da vanguarda viam a situação com outros olhos. Especialmente quando os nomes de Kanoldt, Schrimpf e Lenk foram os únicos citados pelos nazistas ao apontarem quais os nomes da vanguarda que estariam dispostos a aceitar. (imagem abaixo, à esquerda, Solo Germânico, Werner Peiner, 1933; última imagem do artigo, Os Condenados (Die Verdammten), Felix Nussbaum, 1944)



O  movimento  da
Nova    Objetividade
  não tinha um programa,   
mas  se  pode  dizer  que 
ela  foi pós ou mesmo 
anti-expressionista (5)



Mas essa fase durou pouco, a partir de 1937 os nazistas já não sentiam necessidade de fazer concessões. Dezessete quadros de Kanoldt foram retirados de museus e de coleções privadas durante o confisco de obras de arte ocorrido durante a campanha da Arte Degenerada. Evidentemente ele também teve de deixar sua vaga na academia de Berlim-Schöneberg, Schrimpf seguiu o mesmo caminho para fora da mesma academia e seus quadros apareceram na exibição Arte Degenerada no final de 1937 – ambos morreriam nos dois anos seguintes. Lenk se retirou da via pública em 1938, em protesto contra a política cultural dos nazistas. Radziwill seria banido pelos nazistas no mesmo ano. De acordo com Michalski, o rompimento dos nazistas com a Nova Objetividade se justifica devido às premissas de ambos. Os últimos nunca se concentraram em pintar louros com corpos de aço, também mostravam pouco interesse por imagens idílicas de fazendeiros rodeados pela natureza, e menos ainda por amazonas louras a espera de um guerreiro teutônico, sem falar nas pinturas nazistas mostrando corpos nus. Dos temas encontrados na arte nazista (sangue puro, sentimento de comunidade, a verdade incorporada no solo, força, pureza racial, sensação de segurança), Michalski aponta apenas o último como ponto de contato com temas fundamentais da nova objetividade. A única exceção seria os afrescos realizados por Kay Nebel em Schleswig, em 1926.


Notas:

Leia também:

Arte Degenerada
Estética da Destruição
A Nova Objetividade de Otto Dix
Caligari e a Trilha Sonora de Um Delírio
O Mundo Expressionista de Dostoiévski?
O Duplo que Kafka não Queria Ser?
Meu Nome é Espaguete

1. MICHALSKI, Sergiusz. New Objectivity. Neue Sachlichkeit – Painting in Germany in the 1920’s. Köln: Taschen, 2003. P. 202.
2. Idem, pp. 195-202.
3. Ibidem, p. 202.
4. ADAM, Peter. The Arts of the Third Reich. New York: Thames & Hudson, 1992. P. 109.
5. MICHALSKI, Sergiusz. Op Cit., pp. 16, 20.

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